Ética protestante e o espírito do capitalismo (Weber)
Nos anos de 1904 e 1905 o sociólogo Karl Emil Maximilian Weber (1864- 1920) produziu para a revista alemã “Arquivos de Ciências Sociais e Política Social”, os textos que deram origem a sua obra “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo” (no original em alemão Die protestantische Ethik und der 'Geist' des Kapitalismu).
O cerne da reflexão weberiana é apreender o fenômeno observado na transição do século XVI para o XVII, caracterizado pelo protestantismo relacionado diretamente ao desenvolvimento do sistema econômico capitalista.
O conceito de vocação – entendido como chamado de Deus para o exercício profissional - que ainda era apresentado como base motivacional do moderno sistema econômico capitalista. Weber foi responsável por relacionar o papel do protestantismo cristão à formação do comportamento típico do capitalismo moderno.
E através de seus estudos foram descobertos que os valores do protestantismo (a disciplina ascética, a poupança, a austeridade, a vocação, o dever e a valorização do trabalho como instrumento de salvação da ética protestante) promoveram o surgimento do capitalismo.
Tais valores foram incorporados à ética ocidental como a estrutura da confiança, o valor essencial, a manutenção da sociedade do contrato, sendo assim designado como sociedade burguesa. Ressalta-se que foi através da concepção weberiana que foi apresentada a valorização do trabalho e da riqueza produzida como um dever moral
Immanuel Kant
Immanuel Kant nasceu em 1724, na cidade de Konigsberg, na Prússia, onde estudou, ensinou e viveu até a sua morte, em 1804. Descendia de uma família modesta que deixou a Escócia cem anos antes do seu nascimento.
A mãe era uma devota pietista e o pai um modesto artesão correeiro. De 1732 a 1740, frequentou o Collegium Fredericianum, obtendo uma formação clássica. Logo a seguir, como aluno na Universidade de Konigsberg, em 1755, iniciou a atividade de docente e exerceu, durante 15 anos, a função em carácter provisório. Por duas vezes de candidatou ao cargo de professor efetivo, mas só em 1770 foi nomeado catedrático de lógica e metafísica.
Durante este período escreveu um tratado de pedagogia, do qual apresentava recomendações pedagógicas excelentes, embora não utilizasse nenhuma. A Ética de Kant foi considerada, durante muito tempo, como referência da ética iluminista, considerado um típico representante do iluminismo. Acreditava no poder da razão e na eficácia da reforma das instituições e através desta teoria chegou a afirmar que a paz perpétua estaria assegurada quando todos os países fossem repúblicas.
Na obra “Crítica da Razão Prática”, Kant procura responder a questão: “Que forma deve um preceito assumir para ser reconhecido como moral?” Kant (2008) aborda esta questão a partir de uma asserção inicial de que nada é incondicionalmente bom, exceto a boa vontade. A saúde, a riqueza, o intelecto, são bons apenas quando são bem usados.
Mas a boa vontade é boa; brilha como um joia preciosa ...O único motivo da boa vontade é cumprir o seu dever pelo dever. O que quer que procure fazer, faça porque esse é o seu dever.” Segundo o filósofo o homem, constantemente, era colocado a prova no sentido de ter que escolher entre as suas inclinações e o cumprimento do dever, uma vez que a obediência à lei estava acima de todas as coisas.
Ao se referir à lei Kant não afirmava que deveria, em todas as circunstâncias, respeitar as leis positivas, mas, sim, que o dever obrigava o cumprimento da Lei Moral.
Contudo,
qual é o conteúdo da Lei Moral?
Como tomar consciência do seu conteúdo?
Toma-se consciência da Lei Moral quando é realizada a seguinte pergunta:
posso universalizar a minha resposta?
O teste do imperativo categórico reside
na sua universalização, ou seja, pode-se fazer dela uma lei universal?
O exemplo dado aqui é o do cumprimento da promessa, uma vez que se as pessoas não
derem garantia de cumprimento das promessas, imediatamente, deixam de ter
qualquer sentido fazê-las, porque finda a confiança entre as pessoas.
A Lei Moral não tem efetivamente conteúdo; uma vez que acaba sendo
uma expressão puramente formal e limita-se aos contornos do imperativo categórico. Esse formalismo da ética kantiana tem sido visto, por alguns, como a
expressão da vitória da razão e da autonomia do agente cognoscitivo e, por outros, como uma posição carregada de esterilidade, que permite, na verdade, integrar todas as posições e condutas.
Em seu livro Crítica da Razão Prática (2008), Kant considera que a religião se
baseia, não na ciência e na teologia, mas, sim, na moral. Mas para isso a base
moral da religião deve ser absoluta e não derivada da experiência sensorial ou
da dedução.
É preciso encontrar uma ética universal e necessária. "Os princípios a priori da moral são absolutos e certos como os da matemática. Devemos mostrar que a razão pura pode ser prática, isto é, pode por si mesma determinar a vontade, independentemente de qualquer coisa empírica e que o senso moral é inato e não derivado da experiência. O imperativo moral requerido para base da religião deve ser um imperativo absoluto e categórico" (Durant (s/d). p. 274) Exemplificando a sua noção de imperativo categórico, Kant dá o exemplo da mentira: "quero sair-me de apuros dizendo uma mentira?
Mas embora podendo querer a mentira, não posso de modo algum pretender que mentir seja uma lei universal. Pois com semelhante lei não poderia haver compromissos. Daqui o ter eu a impressão de que não devo mentir, mesmo que mentir me traga vantagens. A prudência é condicional; o seu lema é: proceder honestamente, quando for a melhor táctica; mas a lei moral é em nossos corações incondicional e absoluta"(Durant (s/d). p. 275)
Este exemplo ilustra o formalismo da ética kantiana, que levado às últimas consequências quer dizer que deve-se ignorar os contextos e os particularismos no processo de tomada de decisões morais. Sabe-se que a vida não pode se isolar das circunstâncias, que não existe, na verdade, um Homem universal pairando sobre as circunstâncias, como pensava Kant, mas existia um Homem situado, profundamente dependente da sua herança cultural e condicionado pelas suas circunstâncias. E o que é uma ação boa? "Uma ação é boa não pelo bom resultado ou pela sua sensatez, mas por ser feita em obediência a este íntimo sentimento do dever, a esta lei moral que não procede da nossa experiência pessoal, mas legisla imperiosamente e a priori sobre o nosso procedimento passado, presente e futuro. A única coisa incondicionalmente boa deste Mundo é a boa vontade - a vontade de obedecer à lei moral, independentemente do seu proveito ou desvantagem para nós". (Durant (s/d). p. 275) O imperativo categórico obriga, incondicionalmente, um proceder para consigo e para com os outros sempre como um fim e nunca como um meio.
Vivendo no respeito pelo imperativo categórico, pode-se construir uma comunidade racional ideal. Mas o que é o imperativo categórico? A linguagem imperativa é prescritiva e os imperativos podem ser hipotéticos ou categóricos.
Os primeiros são condicionais, os segundos são absolutos. Para Kant, a concepção de um princípio objetivo, na medida em que se impõe necessariamente a uma vontade chama-se mandamento, e a fórmula deste mandamento chamasse imperativo.
Todo o imperativo que manda incondicionalmente como se o ordenado fosse um bem em si, é categórico.
Kant formula o imperativo categórico de várias maneiras:
1) “obra só de acordo com a máxima pela qual possas ao mesmo tempo
querer que se converta em lei universal” (fórmula da lei universal);
2) “obra como se a máxima da tua ação devesse converter-se pela tua
vontade em lei universal da Natureza” (fórmula da lei da Natureza);
3) “obra de tal maneira que uses a humanidade tanto na tua própria pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre por sua vez como um fim, nunca
simplesmente como um meio” (fórmula do fim em si mesmo);
4) “obra de tal modo que a tua vontade possa considerar-se a si mesma
como constituindo uma lei universal por meio da sua máxima” (fórmula da autonomia);
5) “obra como se por meio das tuas máximas fosses sempre um membro
legislador num reino universal de fins” (fórmula do reino dos fins).
O imperativo categórico kantiano tem sido objeto de várias críticas: a objeção sociológica considera que ele é a matriz de uma ética burguesa; a objeção teológica afirma que é o ponto culminante de uma ética autónoma que atribui ao homem a possibilidade de encontrar o bem sem a inspiração divina; a objeção psicológica afirma que ele faz depender a ética exclusivamente da vontade; a objeção filosófica afirma que é um imperativo inteiramente subordinado à razão, que pode ser contrário aos imperativos da vida.
Decorrente do imperativo kantiano é a crença de que cada um de nós é um agente moral autónomo, entregue
apenas à autoridade da razão e sem a presença de nenhuma autoridade externa, nem mesmo divina, capaz de proporcionar um critério objetivo para a moralidade. A ética kantiana
"faz do indivíduo o soberano moral; torna-o capaz de rejeitar todas as
autoridades externas. Deixa o indivíduo livre para perseguir tudo aquilo
que ele quiser, sem sugerir que ele deve fazer outra coisa. Os exemplos típicos do imperativo categórico kantiano dizem-nos o que não fazer: não quebrar as promessa, não dizer mentiras, não cometer suicídio, etc.
Mas em relação às atividades que devemos realizar e aos fins
que devemos perseguir, o imperativo categórico parece ficar em silêncio". (MacIntyre, 1998, p.197)
O teste kantiano para uma verdadeira máxima moral é o teste da universalidade. Com esse teste não há lugar para a existência de verdadeiros conteúdos morais, porque a noção kantiana do dever é tão formal que pode admitir
quase todos os conteúdos.
Kant simpatizava com a revolução francesa e mostra
ao longo da sua obra uma clara antipatia para com o servilismo e o paternalismo.
Amava acima de tudo a independência de espírito e acreditava no poder libertador da razão e da educação.
"A vitória aparente da Revolução sobre os exércitos reacionários em
1795 levou Kant a esperar que as repúblicas se espalhariam então por
toda a Europa e surgiria a ordem internacional baseada numa democracia sem servidão nem explorações e empenhada na manutenção
da paz. A função do governo é, afinal de contas, auxiliar e desenvolver
o indivíduo e, não, usar e abusar dele. Todo o homem deve ser respeitado como um fim absoluto em si mesmo - e é um crime contra a sua
dignidade de ser humano utilizar-se do homem como mero instrumento
para algum fim no exterior". (Durant (s/d). p. 282)
Na Crítica da Razão Prática, Kant (2008) coloca o problema da moralidade de uma forma profundamente inovadora, respondendo a questão sobre as origens da bondade de um ato. O filósofo afirmava que nos sistemas anteriores de ética procurava a moralidade no fim dos atos, o quer dizer que fazendo assim radicaria a bondade e adaptando-a a um fim concreto determinado.
Assim, por exemplo, os hedonismos descobrem este fim no prazer, ou a moral religiosa, assinalando-o no cumprimento de uma lei divina. Mas aquele que age assim, diz Kant, não age por razões morais, mas por algo alheio à própria moral, já que a verdadeira moral não é heterônima (lei alheia, imposta), mas autônoma.
Assim apenas age moralmente aquele que o faz por respeito à Lei, sem razões distintas a este mesmo cumprimento. E que lei é essa em que se assenta toda a moralidade? Kant encontra uma nova forma, uma forma da razão prática, o espaço e o tempo, que eram parte de uma razão especulativa. Esta nova forma classifica-se como imperativo categórico ou lei moral em que deste o agir, norma de conduta, possa dar origem a uma norma de conduta universal.
Assim, se perante uma ação qualquer pode-se admiti-la sinceramente como norma de conduta geral, essa ação é legítima moralmente; caso
contrário, não. Esta lei ou imperativo é puramente formal, uma vez que em si
mesma não ordena nada em concreto, mas serve para quaisquer tipos de
conteúdos ou atos. Segundo Kant, não se deve praticar um ato porque é bom,
mas é bom porque deve fazer.
A moral radica apenas numa forma do agir - o da
razão prática.
Vale ressaltar, que segundo Kant, estas regras são puramente formais,
pois não fornecem receita material para nenhuma norma de conduta. Só a intenção formal conta - “age como deve, suceda o que suceder”.
A liberdade do Homem consiste no agir por dever. E a reta conduta torna-me digno de felicidade, mas não a garante. Agindo por dever cumpro o papel de ser moral, mas não garanto a minha felicidade, tornando-me apenas digno dela.
Mas, então, qual é a relação existente entre moralidade e felicidade? O
pensador afirmava que a felicidade era o bem-estar máximo no nosso estado
presente e em toda a nossa condição futura.
Contudo, não aceitava que a felicidade fosse sinônimo de satisfação dos nossos desejos e inclinações. A vida moral tornava-nos dignos de ser felizes, mas não constituía um passaporte para a felicidade. Uma pessoa moral era a que fazia uso continuado da boa vontade para dar a primazia ao bem fazer, face ao bem-estar. Para ser digno da felicidade era necessário ser virtuoso, mas a virtude baseava-se na autonomia da razão, mas deveria ser desinteressada e não poderia depender de nenhuma autoridade externa, tão pouco poderia ser condicionada pelo medo ou pelo interesse.
A noção de boa vontade apresenta-se como central na ética kantiana, porque era a única coisa que poderia ser considerada boa, sem quaisquer restrições. É a boa vontade que distinguia um ato reto de um ato mau. A inteligência, a coragem e o autodomínio não eram, em si, qualidades morais, porque podiam ser usadas para o bem ou para o mal.
Moral kantiana
A moral kantiana foi a concebida por Immanuel Kant (1724-1804), filósofo prussiano. Sua principal intuição era que o indivíduo devia ser livre para agir "não em virtude de qualquer outro motivo prático ou de qualquer vantagem futura, mas em virtude da ideia de dignidade de um ser racional que não obedece a outra lei senão àquela que ele mesmo simultaneamente se dá" (Kant, 1785: 16). A ação moral exigia a autonomia do agente e ser autônomo era obedecer a si mesmo ou ao que vinha de dentro. É o inverso do heterônomo (o que obedece a ordem do outro, obedece ao que vem de fora).
Não se podia falar em ética sem autonomia, pois a ação heterônoma (cuja vontade vem de fora) não era uma ação ética. A moral aristocrática e a utilitarista não eram eticamente válidas porque dependiam de algo exterior, sendo a primeira, de ideais transcendentes e a segunda, de ideais imanentes.
Para realizar a autonomia, a ação moral devia obedecer apenas ao imperativo categórico, validando o bom senso interior, que nós temos, que é o de perceber que não somos instrumentos e sim agentes. Nunca instrumentalizar o homem era a exigência maior do imperativo categórico e Kant fornece uma regra para saber se uma decisão obedecia ou não ao imperativo categórico, que é a indagação de si mesmo, se a razão que faz agir de determinada maneira pode ser convertida em lei universal, ou seja, válida para todos os homens.
Caso a resposta fosse negativa, esta ação não era digna de um ser racional, não era eticamente boa, pois faltava a autonomia, e estaria agindo premido por circunstâncias exteriores. O bem ético era um bem em si mesmo. Ao realçar a exigência da autonomia da ação moral, Kant desperta a questão da liberdade ética.
O conceito de liberdade ética parte da distinção entre ação reflexa e ação deliberada.
A ação deliberada é aquela que resulta de uma decisão, de uma escolha; é o
mesmo que ação autônoma. A ação reflexa é "instintiva", independe da vontade
do agente. Apenas as ações deliberadas podem ser analisadas sob o ponto de
vista ético. A exemplo desta situação cita-se o caso gato que mordeu o homem
por ter pisado na sua cauda
O gato tentou se afastar do que lhe era um mal, mas
não podemos dizer que escolheu morder o homem. Logo, não se pode dizer que
o gato agiu de forma imoral ou antiética.
A questão da liberdade ética pode ser assim resumida, através do questionamento e da resposta à questão: “Levando em conta que somos animais e,
que, ocasionalmente, agimos de forma reflexa; em quais condições nossa ação
pode ser considerada uma ação deliberada? Henri Bergson (1859-1941) e Jean-Paul Sartre (1905-1980) respondem a essa pergunta de forma radical: “O livre-arbítrio é a qualidade que melhor define o homem.
A própria condição humana
exige que todo ato humano seja um ato de escolha, seja uma ação deliberada.
O homem está condenado à liberdade, porque nunca pode decidir não escolher.
Diante da consciência de que nos vemos forçados a realizar algo por imposição
exterior, passamos a ter liberdade de escolher entre entregar-se à ação ou ir de
encontro a ela”.
Referências
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